sexta-feira, 4 de dezembro de 2009

"A vida me fez de vez em quando pertencer, como se fosse para me dar a medida do que eu perco não pertencendo." Clarice Lispector

sexta-feira, 13 de novembro de 2009

RECIPROCIDADE.

Chutei a lata de tinta, que bateu na parede e me lambuzou.

Confesso, era preciso pintar mais as minhas vestes.

quinta-feira, 5 de novembro de 2009

.mais.

"Além da Terra, além do Céu,
no trampolim do sem-fim das estrelas,
no rastro dos astros,
na magnólia das nebulosas.

Além, muito além do sistema solar,
até onde alcançam o pensamento e o coração,
vamos!

vamos conjugar
o verbo fundamental essencial,
o verbo transcendente, acima das gramáticas
e do medo e da moeda e da política,
o verbo sempreamar,
o verbo pluriamar,
razão de ser e de viver."

Carlos Drummond de Andrade

quarta-feira, 28 de outubro de 2009

.conjecturar.

Enquanto o esverdeado permanece no fruto que avisto daqui debaixo, eu, rego a árvore com aquilo que posso e com o pequeno regador que me pertence. Mentalizo sempre: "Amadureça, amadureça". Ainda vou me deliciar, calmamente. Sei.

quarta-feira, 21 de outubro de 2009

segunda-feira, 19 de outubro de 2009

.benhaqui.

Quando você ficar aquosa na minha visão, não se preocupe. É o modo cru, infantil e tolo que sei fazer ao demonstrar a grande surpresa que cada momento tem sido.

quarta-feira, 14 de outubro de 2009

encarecer

A menina parada em minha frente tinha as bochechas rosadas e um sorriso inocente. Me olhando, tirou as mãos de dentro do bolso, estendeu o braço e me entregou uma maçã. Era uma daquelas bem vermelhas e brilhantes. Depois que peguei, ela virou as costas e saiu correndo e chorando. Enquanto segurava a fruta, eu, tive a sensação de que carregava uma pedra de chumbo.
Eu nunca havia visto uma maçã tão pesada em toda a minha vida.

quinta-feira, 8 de outubro de 2009

antes de.

"Vacilei pelas ruas e as coisas:
Nada contava nem tinha nome:
O mundo era do ar que esperava.
E conheci salões cinzentos,
Túneis habitados pela lua,
Hangares cruéis que se despediam,
Perguntas que insistiam na areia.
Tudo estava vazio, morto e mudo,
Caído, abandonado e decaído,
Tudo era inalienavelmente alheio,
Tudo era dos outros e de ninguém,
Até que tua beleza e tua pobreza
De dádivas encheram o outono."

Pablo Neruda

quinta-feira, 24 de setembro de 2009

.ato.

Com inúmeros blocos, cadernos e papéis ao redor, ela mirou as pálpebras. Disse que era certeiro.
Não há piscada e noite de sono que eu passe sem ler seu nome, incansavelmente.

terça-feira, 22 de setembro de 2009

Receptáculo

Passou o mês inteiro pensando no que dizer a respeito daquela pergunta intrínseca que ela havia feito no dia chuvoso do parque, enquanto observavam os patos sentados em frente ao lago. Em alguns momentos seus pensamentos pareciam um breu que o impediam de enxergar, em outros, uma brancura insuportável, de tão nítida. Em meio a tantas antíteses e certezas ele decidiu ceder o jardim, afinal, era nele que encontrava tranquilidade.
No dia seguinte, enquanto comia cereais, ela olhou pra geladeira num momento de devaneio, avistando um bilhete anexado com o título: 'Apenas', informando como, porque, quando e onde ela deveria adubar e arrancar as folhas.

quinta-feira, 17 de setembro de 2009

Em fendas

-Alô.
-Oi.
-Ah, oi!
-Como você está?
-Bem. Melhorando.
-Bom.
-E, você?
-Bem, também. Sinto sua falta.
-Também sinto.
-(silêncio)
-(suspiro)
-Passei no parque, semana passada.
-Nossa, há anos não vou lá.
-Caio te mandou um abraço, e pediu pra dizer que a jabuticabeira já deu frutos.
-A jabuticabeira!

-(silêncio)
-Ela está grande, bem maior que nós.
-Então, ele estava certo quando disse que ela ficaria imensa?
-Estava.
-Você, ela e eu. Crescidos, distantes e...
-E?
-Tristes. (suspiro)
-(silêncio)
-Preciso ir. Dê um abraço na Lúcia e nas crianças.
-Obrigado, mande lembranças à Rita.
-Sim, mandarei.
-Cuide-se.
-Você, também. Até.
-Até.

sexta-feira, 11 de setembro de 2009

reputar-se

Abriu a porta, andou até o final do corredor e abriu a outra que havia no fundo da casa. De dentro saiu uma luz que quase cegava, de tão brilhante. Jogou mel em todo o chão, deitou e escorregou de barriga, rumo à luz que vinha da outra porta. Logo que ela sumiu naquela abundância de clareza a primeira porta se fechou, lentamente.
Há muito tempo não é vista, desde o cerramento da segunda porta.

quarta-feira, 9 de setembro de 2009

Da chegada do amor (parte II)

"Sempre quis um amor de goleadas
cuja rede complexa
do pano de fundo dos seres
não assustasse. (...)
Agora, diante da encomenda
metade de mim rasga afoita
o embrulho
e a outra metade é o
futuro de saber o segredo
que enrola o laço,
é observar
o desenho
do invólucro e compará-lo
com a calma da alma
o seu conteúdo. (...)
Sempre quis um amor
de abafar,(não o caso)
mas cuja demora de ocaso
estivesse imensamente
nas nossas mãos. (...)
Sempre quis um amor não omisso
e que suas estórias me contasse.

Ah, eu sempre quis um amor que amasse."

Elisa Lucinda. Poesia extraída do livro "Euteamo e suas estréias"

quarta-feira, 2 de setembro de 2009

Incidente inopinado

Clara passava todos os dias pela mesma rua, que tinha uma praça na frente, a igreja em uma esquina e na outra uma casa verde de janelas brancas que trabalhava um senhor que fazia carimbos.
No domingo, voltando do sarau, enquanto tentava lembrar trechos daquela poesia que tanto gostava, "... porque não voltar a apalpar as primeiras formas..." teve o pensamento interrompido pelos olhos surpresos e fixos na fila enorme que dobrava a esquina da igreja. Se recompôs e seguiu a fila em busca do começo, afim de desvendar o alvoroço. Quando chegou na primeira pessoa percebeu que estava em frente a casa verde. Um rapaz baixo, de óculos, saiu rapidamente de dentro da casa, esbarrando nela. Clara caiu na calçada, e em cima dela, algumas caixinhas que ele carregava. O rapaz, desconsertado, apanhou todos, se desculpou e partiu. Ela, limpou o vestido, levantou e viu no chão uma caixa que havia ficado, colocou-a no bolso e correu para alcançar, mas não conseguiu. Cansada da corrida, sentou na grama e ficou na praça observando a fila diminuir.
Após algumas horas, já em casa, lembrou da caixinha e resolveu abrir. Dentro, havia um pequeno pedaço de um tecido xadrez embrulhando um carimbo. Ansiosa, tirou-o da caixa. O desenho em relevo era um círculo pela metade, com o nome dela escrito dentro. Espantada, buscou a caixa para obter informações, no verso havia uma instrução: "Carimbo mágico - funciona somente com a outra metade." E na tampa, um aviso em vermelho: "Use somente nos olhos."

segunda-feira, 31 de agosto de 2009

.parecença.

Tirei os sapatos, dobrei as pernas no banco e passei a maior parte do tempo olhando as gotas que caíam no vidro da janela. Era uma, depois outra, que se fundiam com uma soma de muitas delas. A praia ficou deturpada atrás da dança das gotas, e para a praia eu também era uma menina que não se podia encontrar nítida.

sexta-feira, 28 de agosto de 2009

re_conhecer

Feromônios são substâncias químicas que, captadas por animais de uma mesma espécie (intra-específica), permitem o reconhecimento mútuo.
Há cachorros acasalando com galinhas, bodes com gatas, peixes com coelhos, éguas com águias... e há os que preferem os animais da mesma espécie. Não há o porque de guelras, chifres, coices e especificações, se só me basta uma barriga quente de filhote mamífero.

sexta-feira, 21 de agosto de 2009

.arrarar.





'Raros?
Teus preclaros amigos.
E tu mesmo, raro.
Se nas coisas que digo
Acreditares.'
Hilda Hilst





terça-feira, 18 de agosto de 2009

chuva na cútis, em dia de céu aquoso...
com bonança em tempestade e tempestade em bonança. tsc.

terça-feira, 4 de agosto de 2009

descoberta

Puxe, está frio. Mas, está no chão. Deixe que eu levante. Obrigada. Ai, desculpe, machucou? Não, você pisou na almofada. Que bom. Posso puxar o travesseiro? Claro. E agora, ficou quentinho? Com você do lado, sim. Ai, que pé gelado! Posso esquentar em você? Tudo bem. (Silêncio). Queria conversar. Hum. Você já está dormindo? Não totalmente. Então posso falar? Ahan. É sobre eu ter sido incisiva quando conversamos no almoço, me desculpe. Sinto muito, também me armei. Queria demonstrar que sabia, e acabei te mostrando que não sei mostrar como sei. A gente ainda vai passar muito por isso. Mas pode ser diferente. Não se preocupe, o próximo claramente será. Me sinto melhor agora. Eu também, obrigada por se importar. Obrigada, por não se importar. Ta, boa noite. Boa noite. Ah, mais uma coisa. Que? Escrevi o contrato hoje a tarde, depois do nosso almoço de descoberta. Aquele sobre acordos e quereres? É. Me lembro. Quando você acordar, leia. Mas onde está? Na mesa do lado da janela, no canto onde bate a primeira luz do sol que toma a sala. Sei. Se você concordar, na gaveta da escrivaninha tem uma caneta verde. Não preciso ler. Leia. Sim, será a primeira coisa. E pra comer, no forninho tem aquelas tortinhas que não lembro o nome, que nós comemos há algumas semanas. Hum, aquelas. É. Durma bem. Você também.

sexta-feira, 24 de julho de 2009

.uníssono.

Deitada no tapete, só de roupão, fiz um esforço enorme pra ligar o rádio sem precisar me mover demasiadamente. Estiquei a perna e com o dedão do pé apertei o 'play' sem ter a menor ideia do que as caixas de som me reservavam. Tocava uma música que eu nunca havia escutado... que me deixou com uma sensação de liberdade, como há muito tempo não me sentia. Passei o resto do dia assim. Ainda estou cantando em pensamento, errando algumas palavras, no aguardo de uma possível chance de ouvi-la de novo.
Algumas melodias são como beliscos, apertos, abraços, socos, pontapés, beijos e inúmeras outras materializações de sentido.
Tudo depende do fado.

segunda-feira, 20 de julho de 2009

incorrendo

Juro que tentei chegar, mas estava escuro e no caminho havia um buraco. Ainda estou aqui tentando sair, gritando, esperando que alguém passe e me ouça, vendo os pássaros voarem e cagarem sobre a minha cabeça.

quinta-feira, 16 de julho de 2009

Sobre salamandras

"Os anfíbios constituem uma classe de animais vertebrados. A caraterística mais marcante dos seres vivos da classe é o seu ciclo de vida dividido em duas fases: uma aquática e outra terrestre, apesar de haver excepções. Já adultos, a dependência da água dos anfíbios jovens é superada parcialmente, e após a metamorfose estes animais podem deixar a água e viver em habitat terrestre. Apesar de pulmonados, os representantes dessa classe possuem uma superfície alveolar muito pequena, incapaz de suprir toda a demanda gasosa do animal. Portanto, como complemento à respiração pulmonar, os anfíbios realizam a respiração cutânea (trocas de gases através da pele), e para tanto possuem a pele bastante vascularizada e sempre humedecida.
Alguns anfíbios podem ser venenosos, sendo que alguns deles estão inclusive entre os animais mais venenosos. Entretanto, este veneno é eliminado apenas quando a glândula é apertada.
O manuseamento de anfíbios é normalmente seguro, desde que o veneno não entre na circulação sanguínea. Deve-se por isso lavar as mãos depois do contacto com os animais."

Há ocasiões que preciso me humedecer, sinto-me parcialmente superada em muitos aspectos, demasiadamente venenosa quando comprimida, necessito de trocas em contacto com a pele e constantemente em fase aquática e terrestre.
Me identifico tanto com as salamandras, todavia é fato que eu uso pijamas e penso em cinzas e perdas, elas não.
Mágico.

quarta-feira, 15 de julho de 2009

Breve

Mandaria flores, mas da última vez que se encontraram ele rasgou a carta dela ao meio e caiu em prantos. Ligaria, porque mesmo depois de apagar todas as anotações os números ainda estavam na memória, mas ela não atenderia. Daria outro animal de estimação, já que o responsável pelo sumiço de seu cão, Fleming, foi ele, mas ela não perdoaria. Iria até a casa dela, mas seria o início de uma guerra com marcas de arranhões na face e ela o mataria. Escreveria uma carta ou um e-mail, mas ela não responderia, e o que ele precisava era uma resposta.
Desolado, sem nada que pudesse fazer com que ela simplesmente soubesse que ele ainda pensava neles, que ainda gostava 'deles' e que se arrependera, resolveu fazer um avião de papel colocando no meio o biscoito favorito que Fleming gostava. De manhã abriu a janela do quarto, que ficava no décimo segundo andar, beijou a dobradura e lançou. Respirou aliviado e voltou a dormir os vinte minutos que lhe restavam antes do dia caótico que o esperava. Sorrindo sozinho e murmurando para o travesseiro rezou para que ele e o cão voltassem juntos e brevemente para casa.

terça-feira, 14 de julho de 2009

limp_des

Hoje comprei um rodo com o intuito de voar. No cair da tarde saí com ele e um sabão em pedra na mão pra passear por cima da sua casa, e lá estava você fumando no quintal. Mirei e lancei o sabão rumo a sua cabeça. Acertei e você acabou desmaiando sem conseguir ler o bilhete amarrado nele: 'Pra você! Lave a boca, meu amor.'

segunda-feira, 13 de julho de 2009

Enquanto pensava incoerências, escrevia em guardanapos no balcão. Saíram tantas palavras e minha esferográfica já reclamava, sem tinta. Quando fui pegar mais um percebi que acabara com o estoque e estava cheia de guardanapos e vómitos verbais sob meus cotovelos. O prato sujo com os restos da minha alimentação me causou um asco que rapidamente resolvi 'defuntando-o' com um dos guardanapos abertos. O quadrado fazia um 'xis' no meio, que separava em grupos de sensações o que havia escrito: a perda, o gozo, os pesares e as vontades. O garçom passou levando o que eu não queria mais, o que eu gostaria de viver, o que eu conseguiria ser e o que eu não poderia ter... e só consegui respirar profundamente aliviada quando vi tudo aquilo indo embora.
Enfim, levantei e segui rumo ao meu destino.
Assim que cheguei, quando coloquei meus pés do portão para dentro fui tomada por um silêncio cerebral, que me impossibilitava de pensar em qualquer coisa, todavia continuei andando até a lápide. Com ela em minha frente sentei e fiquei muito tempo olhando pra foto dele de olhos puxados e pequenos com um sorriso escapando no canto dos lábios. Fiquei calma,(...) me despedi e fui embora.
Na volta pra casa, enquanto o frio queimava minhas bochechas ruborizando meu rosto, senti uma coriza pedindo para sair junto com lágrimas, como todas aquelas palavras escritas. Vendo letras pingando busquei rapidamente algo no bolso da jaqueta que pudesse me poupar de lê-las, limpei tudo com um daqueles guardanapos que me havia restado, que estava rabiscado com o desenho de um coração e uma flecha no meio.

quarta-feira, 8 de julho de 2009

há-de...

Antes de entrar li um aviso informando que eu deveria deixar os sapatos do lado de fora, o fiz, e pisei naquele chão cheio de cacos, pontas e pregos que circundavam uma pequena almofada bem no centro da sala com uma caixa suspensa no teto, em cima dela. As paredes, o teto e os objetos eram repletos de espelhos e para todos os lugares que olhava me via.
Resolvi enfrentar o caminho, a fim de descobrir o que havia lá. Quando finalmente pisei na almofada, tingindo-a de rubro, abri a caixa perdendo o equilíbrio e caindo junto com o que havia nela, e fui surpreendida com um banho de tinta, na cor verde. A tinta escorreu pelo chão tirando os cacos e cobrindo o rastro de sangue que eu havia deixado. Olhando para aquela imagem no espelho me levantei, tentei limpar os olhos e segui caminhando até a porta, onde meu par de sapatos me esperava, limpo, para voltarmos juntos e esverdeados para casa.

quinta-feira, 2 de julho de 2009

.olhava.

Não verei mais o mar na minha frente...

muito chão.

domingo, 28 de junho de 2009

post it

Não esquecer
de apagar
as reticências

segunda-feira, 22 de junho de 2009

.ménage à trois.

Logo que chegamos ela já passou seu pacotinho de balas, oferecendo. Depois de olhares e sussurros a palestra acabou e nosso tão necessitado encontro começaria. Eu falava, ela comentava e ele observava e ria. No restaurante, ela com seu jeito evidente e radiante colocou as mãos abertas sobre a mesa e disse:
- Vamos começar por setores, hum... você! (apontando pra mim) Fale do trabalho.
Logo foi a vez dele, a conversa se desenrolou, falamos sobre amor, rotina, sexo e afins. Jantamos. Encostadas na parede, já de barriga cheia, olhamos para ele que falava de suas semanas, dos acontecidos enquanto longe de nós com seu jeito reservado e sereno de expressar. E, de repente, nos demos conta da plenitude daquele encontro, que estar perto nos fazia bem.
Olhando para cima, pensativa, ela suspirou e falou:
-Temos que fazer isso mais vezes, é tão bom!
Todos concordamos com palavras curtas balançando a cabeça. Olhamos o relógio, era tarde. Saímos e nos despedimos.
No outro dia tudo parecia mais limpo e leve como se estivesse mesmo em casa, aconchegada.

Lar é a tradução da palavra ménage para o português... e não há nominação melhor.

terça-feira, 16 de junho de 2009

.porvir.

Em situações que somente o limite consegue estabelecer final, surgem questões que se referem ao respeito próprio: Porque chegamos até aqui? Porque chegarmos até aqui? Por onde chegamos até aqui? Esse olhar invasivo e duro, que penetrou como lança, deixou nosso fim de dia sangrento de palavras antigas. Ferindo agregados e vizinhos, que com gotas vermelhas em suas roupas e pasmos se limpavam pedindo respostas. Ninguém respondeu.
Estar farto de tudo isso que rodeia, conclui um resto de dor e feridas desnecessários. Ambos os lados puderam, mas não conseguiram evitar.
Agora, limpos de gotas e pintados de branco é preciso restar carinho, lembrança e um imprescindível ponto final (.).

Guardo o ponto na caixinha de recordações, abro os braços para o presente... e digo:
-Me segure, que estou pulando.

quarta-feira, 10 de junho de 2009

quinta-feira, 4 de junho de 2009

daqui prali

Tirei o giz de uma caixinha que na embalagem dizia: LIMITE.
No chão desenhei um círculo que me rodeava, dando espaço para sentar, deitar, rolar, pular.
Do lado de fora coloquei uma pequena placa: 'Passando desta linha, você é obrigado a sorrir'.
Era sonho...

segunda-feira, 25 de maio de 2009

"A nossa verdade possível tem de ser invenção, ou seja, literatura, pintura, escultura, agricultura, piscicultura, todas as turas deste mundo. Os valores, turas, a santidade, uma tura, a sociedade, uma tura, o amor, pura tura, a beleza, tura das turas."
Julio Cortázar

domingo, 24 de maio de 2009

sobre estar

Quando uma pergunta chega, entra sem permissão e lhe pede uma resposta, o mais correto seria ignorar. Falar a respeito do que não é palpável ou simplesmente do que você não gostaria que lhe pertencesse é estúpido, e pode chegar a insultar. Fora o fato de receber visitas, opiniões e presenças que a vida se sente no direito de lhe direcionar.
Esta falta de controle sobre o que atinge o humor acaba adicionando rugas num ser humano que ainda possui somente um quarto de século.
Ah, para a merda esta falta de propriedade e limite entre o que é meu e o que é do mundo!

P.S.: ... e ainda hei de fazer um projeto sobre bolhas, contra a invasão da Cinesfera.

terça-feira, 12 de maio de 2009

quarta-feira, 6 de maio de 2009

Da chegada...

"...que me coubesse futuro
e me alternasse em menina e adulto
que ora eu fosse o fácil, o sério
e ora um doce mistério
que ora eu fosse medo-asneira
e ora eu fosse brincadeira
ultra-sonografia do furor, ..."

Elisa Lucinda

sexta-feira, 1 de maio de 2009

.cautela.

Andar sobre ovos fere a sola do pé, ou com muita sorte há como mantê-los intactos. É preciso pensar no dono dos ovos, no dono dos pés e principalmente no que há lá dentro, pois não se vê a olho nu... em último caso, espere que o pintinho nasça para que você possa pedir licença e passar.

sexta-feira, 17 de abril de 2009

in...

Fui tão ególatra, que imaginei meu copo mais fundo pra continuar me vendo no reflexo da água, podendo assim me satisfazer demasiadamente daquilo que matava a minha sede de respostas,
eu mesma.

terça-feira, 14 de abril de 2009

Tributo

Mesmo depois de tanto tempo,
empresa no meu nome,
de recibos assinados,
cada um na sua casa,
dívidas quitadas,
móveis divididos
e eu... limpa do 'nós',

a vida ainda manda suas contas pra eu pagar.

quarta-feira, 1 de abril de 2009

'dos pés à cabeça'

Os olhos que param em frente a um objeto que não se vê.
Lá nas pupilas, no abismo do negro que permite um salto no escuro e uma descoberta de mundos e 'porquês' há um humano que sente, chora, ri.
Contato indireto com outro humano longe que por incrível que pareça anda tão perto que parece estar sentado aqui, bem do lado.
Espera de sorrisos que se encontram após uma pausa para a reflexão de um para sempre finito.

Viver pensando
Respirar esperando
Aliviar consentindo.

sexta-feira, 20 de março de 2009

de_feitos

Fecho os olhos. Dentro de mim há inúmeras paredes com imagens do que jaz ocorrido, e o sentimento é instantâneo em cada uma delas: melancolia, afago, riso, choro, dor, tesão e muito mais referências sensoriais que me deixariam viciada e eternamente flutuando na sala escura gigantesca de paredes interativas. Posso reviver tudo como telespectadora, levantando pontos negativos e positivos com a finalidade de diminuir angústias ou somente entendê-las, praticando o exercício rotineiro de auto-reflexão e melhora, para aquilo que acredito ser correto.
Alguém passou a mão na minha cabeça, outra mão me abate, outra afaga, agita, e me perco em antíteses num paradoxo entre o bem e o mal.
- Acalme-se, os feitos aparecerão, efeitos lhe ensinarão e defeitos lhe diferenciarão!

segunda-feira, 16 de março de 2009

aba ter

Caminhando na cidade, eu, repleta de pensamentos sobre a vida, acontecimentos, preocupações com o trabalho e logísticas necessários para o bom funcionamento do meu dia fui surpreendida com as palavras de um transeunte que caminhava, em sua vida também, na minha direção. Tudo o que eu havia organizado em minha mente se propagou naquele segundo de difusão súbita em que o outro sentiu-se no direito de dirigir a palavra a mim, palavra cujo a significação nem me faz bem falar. Estou dentro daquela sensação de uma lembrança que pode causar náuseas ou uma revolta estupidamente grande na qual o protagonista da novela se sentindo traído joga o vaso caríssimo no vilão. A conjugação diária do verbo invadir que alguns seres humanos se submetem é revoltante: Eu invado, Tu invades,... Eles invadem, e é aí que o problema se torna maior. O plural torna o viver abalado, e a impossibilidade de fluidez, de ser aquilo que hoje me der vontade de ser: cru... (aquele cru que respeita o próximo e o anterior).
Não queria bancar a ativista, só precisava mesmo organizar a confusão que um segundo na vida foi capaz de causar.

sábado, 14 de março de 2009

ensejo

Foto: Júlio Boaventura

Fazer-se instrumento produtivo,
persuadindo um futuro-vácuo
que repulsa uma conclusão
ou um singelo ponto final (.).

quarta-feira, 4 de março de 2009

reticências

Toque dos meus dedos no seu rosto são pedaços de eternidade, que carrego pra todos os lugares e posso sentir quando quiser lembrar e eriçar pêlos.

quarta-feira, 25 de fevereiro de 2009

Novos serem possíveis.

Em alguns momentos dou conta do cabresto que carrego. Será que é preciso surpresa pra que ele caia? A alegria harmônica predomina muito mais que o caos... e ainda sei valorizar o terror. Espantoso é o desabrochar de uma rosa parecer algo comum e ordinário, sendo que é maravilha divina ocorrendo esporadicamente ao nosso redor, e eu preocupada com o que virá, desvalorizando, ou melhor, nem questionando o incrível acontecer diário. Tem razão quando diz que quando pára pra pensar de novo no assunto do futuro ele nem parece tão pesado assim... talvez seja porque cair de chuva tenha sido percepção de mágica, sorrisos tenham sido percepção de conquistas e as dúvidas percepções de possíveis surpresas.
Quem salva uma formiga que caiu na água da panela é um ser-humano-fruto de um reconhecer eterno, de saúde que me permite tudo, paixão que me abre mundo, valor que me segura mudo... mudo de queixas e cego de feiúras.
Abrir os olhos, mas para ver.
Ter ouvidos, mas para ouvir.
Ser sorrisos, mas para sentir.

terça-feira, 17 de fevereiro de 2009

.inteireza.

Comendo pão de queijo enquanto leio em voz alta um trecho do livro que me lembrou você:
"... um encontro casual era o menos casual em nossas vidas e de que as pessoas que marcam encontros exatos são as mesmas que precisam de papel com linhas para escrever ou aquelas que começam a apertar pela parte de baixo o tubo de pasta dentifrícia." Julio Cortázar

sexta-feira, 13 de fevereiro de 2009

.revelar.

Mirar você enquanto diz tantas coisas que me fazem achar que sou uma pirada, maníaca.
Recear em dizer e um segundo depois ouvir uma resposta de uma pergunta que ficou na minha cabeça, que você nem chegou a ouvir e mesmo assim me deu.
Quando você vira a cabeça com olhos baixinhos, faz aquela expressão, aquela que você sabe... puta que pariu, se pudesse entrar pelas suas pupilas enquanto isso acontece, ia descobrir tudo que me faz amolecer, calar, vagar e rir.
Não sei porque lá em cima resolveram te esconder, mas sei que teriam me poupado de muitas coisas.
Acordar depois da nossa segunda-primeira vista e tê-la na frente dos olhos, mesmo longe, plantou um ponto de interrogação gigantesco no fim de uma pergunta que não quer calar:
-Por onde você andou?

quarta-feira, 11 de fevereiro de 2009

Dar começo.

Quando o destino surpreende, a impressão que dá é de que a teoria dura e fria levou uma porrada e desmontou tudo. Sem graça, disfarçadamente colho os caquinhos me convencendo de que nem era tão dura assim, e que a luz que saiu quando tudo desabou jaz dentro de mim, sempre. No dicionário o significado da palavra destino aparece também como vida. Quem sou pra negar? Quando paro pra pensar e observar com muita calma as coisas que aconteceram sem eu planejar, vejo uma regra que não posso dominar caindo sobre meus ombros dizendo: -Carregue! Todos os planos foram por água abaixo, todos os acasos ainda vivem em mim.
Encontrar é saber que aquilo, aquele, enfim... existe pra ser ou estar com você algum dia e chega leve entrando como chuva fina. Quando se dá conta, já dominou tudo, cabeça, corpo, vida... como tempestade.
Agora sinto que estou sem saber de mim, e das minhas capacidades. Era convencida de que o turbilhão no estômago nunca mais apareceria, mas que drama, fazendo o mundo escancarar pra mim tudo o que há de mais íntimo perdido por aí, e eu só não tive por que o tal do destino, sina... esse aí, não quis antes, quis agora.
Deitada olhando pro teto fiz minhas análises logísticas, e não é que esse tal tino faz tudo direitinho?!

quinta-feira, 5 de fevereiro de 2009

esCOLHE

O acaso se encarrega e a gente escolhe se carrega ou não.

Se é pra certificar se existe, dispensa-se um belisco.

Entre dormir ou não, optar por devaneios na madrugada.

Escolha e colha.

terça-feira, 3 de fevereiro de 2009

"...meus olhos deram de falar."

Apareceu como um repentino vento acariciando a pele, um segundo depois consegui ver beleza no que me rodeava sentindo as vidraças da minha estufa caindo estilhaçadas...

quarta-feira, 28 de janeiro de 2009

.Impressão.

Fim de tarde sentada na cadeira da minha escrivaninha, as pernas dobradas, queixo apoiado no joelho,... olho pra baixo e vejo uma fotografia antiga que caiu de um livro meu enquanto fazia a arrumação da manhã. Nela vejo meus pais abraçados ainda jovens em sépia, apaixonados. Os dois vestem branco e minha mãe apoiada nos ombros dele, um homem grande, com a cabeça encostada em seu peito. Aquela fotografia me levou a lugares meus que jamais havia habitado, trouxe um riso, um choro, levou embora minhas angústias e dois segundos depois trouxe inúmeras novas. Pensei no amor extinto do meu clã que um dia sonhou em eternidade, em dois num só, em mim, em vida, animais, morte unida.
Sinto que desde a separação até hoje minha mãe não é mais inteira, e da última vez que vi meu pai, ao pronunciar o nome dela disfarçou a mágoa com uma feição de ira. Contudo, nada me impede de enxergar a dor da frustração, de algo que nasceu, cresceu, se multiplicou e desmoronou... e sentir isso dentro da minha mãe, olhando pra ela e vendo a tristeza transbordando até mim, me faz aceitar em deixar ressentir o que um dia em minha vida também não funcionou, desmoronou. Todo mundo uma hora parte, mas a parte que fica de todo mundo completa um pouco do que não nasceu em nós.
Sabe, já faz muito tempo que não vejo meu pai, que não sei mais o cheiro dele e o seu jeito tosco de fazer piadas cínicas contagiando até o mais mal-humorado com uma gargalhada. Mas o que ele é, foi e será é parte da minha lembrança... aquela das minhas noites antes do sono quando fecho os olhos e lembro que ia ganhar um beijo, um carinho no cabelo louro escorrido e ele ia me embrulhar como um pãozinho que precisa crescer durante um tempo antes do forno. Talvez eu ainda seja pãozinho cru, crescendo e esperando o afago de fim de noite... e quem sabe um dia eu entenda que isso só deve existir na tela das minhas pálpebras, como um filminho que todos deixam em nós quando passam em nossas vidas.

terça-feira, 27 de janeiro de 2009

escape

Deitar na grama sentindo-a molhar a pele,
olhar pro céu e sonhar naquele segundo durando eternamente.

domingo, 18 de janeiro de 2009

e-se

cumpre se
o
secam
com prece,
suportam
o tampo

portam
tão
comO
cúmplice.

quinta-feira, 15 de janeiro de 2009

des Tino

Praguejado acordo, miro o espelho e nele encontro meu corpo repleto de sinais avermelhados, não vistos a olho nu. Olho pro meu braço, tentando encontrar as pequenas manchas em busca de um alívio da coceira, mas nada encontro. A partir daí demandas de respostas a questões intrínsecas desencadearam sem cessar. Há muita dor não vista, muitas dúvidas não questionadas, muitas palavras não ditas e mesmo assim elas coçam. Eu, preciso olhar o reflexo, analisando os detalhes de cada brotoeja, sabendo assim o remédio adequado de cada uma.
Sem maquiagem logo pela manhã, com sardas, arranhões e pêlos crescendo me incomodo, num aborrecimento da minha própria imagem escancarando o que deve ser curado.
Será que espero um pouco pra ver se passa? Tem essa pomada, Bepan... enfim, será que serve? Tem arnica, álcool, óleo. Há inúmeras possibilidades, mas sei que uma será certeira, me evitando possíveis alergias e resistências ao que não me é adequado.
Rendo-me ao livro com telefones de 'médicos' e em busca deles vou... com ânsia de solução. Sei que eles me guiarão, que junto a eles tenho tino pro mundo e que sem eles todas as doenças já teriam me matado.